Por Jow Oliveira ( servidor e Delegado Sindical)
Há dores que não aparecem nos exames médicos, mas que corroem a saúde dia após dia. São feridas que se abrem lentamente, causadas por palavras ditas com desprezo, olhares que humilham, gestos que isolam, posturas autoritárias disfarçadas de “gestão eficiente”. O nome disso é assédio moral. E ele está mais presente nos ambientes de trabalho do que muitos imaginam — inclusive e, sobretudo, no serviço público.
Não se trata de exagero nem de vitimismo. Estamos falando de uma realidade concreta, documentada por instituições sérias como a Organização Internacional do Trabalho, que revela que ao menos 22% dos trabalhadores em todo o mundo já sofreram assédio em seu ambiente profissional. No Brasil, a situação é ainda mais alarmante: servidores públicos, em especial das esferas municipais e estaduais, enfrentam rotineiramente práticas de coerção, humilhação e silenciamento. E isso tem nome: violência institucional.
O assédio moral não é apenas uma atitude hostil ou um desentendimento pontual. Ele se caracteriza pela repetição sistemática de comportamentos que têm como objetivo — ou consequência — desestabilizar emocionalmente o trabalhador. É quando o servidor começa a duvidar de sua própria competência. Quando passa a sentir medo de ir trabalhar. Quando o corpo começa a dar sinais de exaustão e a mente se vê mergulhada em ansiedade, tristeza, insônia e, muitas vezes, depressão.
É comum que a vítima de assédio sinta vergonha ou culpa. Muitas vezes, acredita que “não está aguentando a pressão” ou que “o problema sou eu”. Mas o problema não está em quem sofre. Está em quem oprime, em quem abusa da posição de poder e em uma cultura organizacional que normaliza a violência, seja por omissão, seja por cumplicidade.
De acordo com dados do próprio Ministério da Saúde, os transtornos mentais relacionados ao trabalho já estão entre as principais causas de afastamento de servidores. E, nos bastidores, multiplicam-se os relatos de colegas adoecendo silenciosamente: professores que choram antes de entrar em sala, agentes da saúde que vivem com crises de ansiedade, assistentes administrativos que convivem com o medo constante de “errar” e serem expostos publicamente.
Essas histórias não são casos isolados. Elas compõem um cenário preocupante de desrespeito à dignidade de quem faz o serviço público funcionar.
Mas é possível romper esse ciclo.
Falar sobre assédio moral é o primeiro passo para combatê-lo. Precisamos criar espaços seguros de escuta, garantir canais efetivos de denúncia e, acima de tudo, promover uma cultura de respeito, acolhimento e valorização do servidor. Não se pode mais aceitar que a pressão por resultados ou metas seja usada como justificativa para o abuso. A saúde mental dos trabalhadores não é um detalhe. É um direito.
Valorizar o serviço público passa, necessariamente, por cuidar de quem está na linha de frente — nos postos de saúde, nas escolas, nos gabinetes, nas ruas, nas repartições. São essas pessoas que garantem o funcionamento das políticas públicas. E elas merecem exercer suas funções com dignidade, segurança e bem-estar.
Ninguém deveria adoecer por causa do trabalho. E ninguém deveria se sentir sozinho ao passar por isso. Se você já sentiu que está perdendo a alegria de trabalhar, se percebe que suas energias estão sendo consumidas por um ambiente hostil, saiba: você não está só. E há caminhos possíveis para transformar essa realidade.
O combate ao assédio moral é uma luta coletiva. E começa por reconhecer que saúde mental também é uma pauta de classe, uma pauta de justiça e de humanidade.